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Editoria feminina:

representação e representatividade na comunicação científica dentro da Biblioteconomia e da Ciência da Informação

por Tatiely Mayara de Oliveira Neves e Hildenise Ferreira Novo*

Press release

As relações que envolvem a informação científica, a mulher e a questão de gênero na Comunicação Científica no que refere-se à estrutura organizacional dos periódicos científicos por meio da representação das suas editorias científicas é o tema desse press release da pesquisa de Neves (2022), que observa o percurso evolutivo da informação científica, bem como a ciência, a política e a valorização das universidades para a educação pública de qualidade, sobretudo, para preservar a importância do ato de informar e, principalmente, de divulgar o que se produz enquanto pesquisa.

O professor Boaventura de Souza Santos (1978) considera que a ciência contemporânea poderia ser analisada pelo contexto socioeconômico-político equivalente ao do mundo na atualidade. Dessa forma, o compartilhamento da informação de cunho científico por pesquisadores, acadêmicos e outros profissionais das ciências torna a comunicação tão importante quanto a própria pesquisa, com a diferença elementar de seguir estruturas e exigências convencionadas em sistemas organizacionais. A exemplo, tem-se o processo de produção informal (fala/oralidade) e o formal (escrita); muitas vezes, o segundo intercede o primeiro numa comunicação formal científica, como sinaliza o pensamento de Fernando César Lima Leite e Sely Maria de Souza Costa (2007).


Entretanto, a quem a informação científica interessa? A informação interessa a todo indivíduo social. Ao passo que as (os) pesquisadoras (es) cientistas têm na pesquisa científica um ciclo de produção, disseminam uma informação que interessa a um campo científico e, por conseguinte, auxiliam na sua evolução como campo. Mesmo apesar do momento ser o de desvalorização de cientistas, os quais se dedicam ao aperfeiçoamento em suas áreas, o desmonte na educação e o futuro incerto da ciência são exemplos de fatores que comprometem o desenvolvimento social, econômico e tecnológico dos países, como pode ser observado com o Brasil em 2022.


Contudo, observa-se a importância da presença da mulher na ciência, assim como a sua contribuição no âmbito dos periódicos científicos em Ciência da Informação e também da Biblioteconomia do território brasileiro, os quais buscam divulgar resultados de estudos da área. A representação da mulher, nesse sentido dentro da editoração científica, é perpassada por relações que envolvem desde a informação científica, a figura da mulher até a questão de gênero no ramo da comunicação científica, especialmente no que refere-se à estrutura organizacional dos periódicos científicos das diversas áreas do conhecimento. O trabalho do(a) editor(a), nessa ótica, é filtrar o que de interessante pode ser divulgado para a comunidade, e dentro do periódico científico, tem a ciência como o seu principal interesse fundador (FREITAS; LEITE, 2019).


A produção científica no Brasil tem nas universidades federais um papel substancial na pesquisa e na ciência, e consequentemente, na produção do conhecimento no país. Assim, estas têm no periódico um certificado, principalmente para apresentarem as suas recentes descobertas, seus aprimoramentos, o que funciona, inclusive, como ferramenta no processo da formação acadêmica. Embora não tenha uma formação específica profissional para o(a) editor(a) de revistas científicas, essa função é ocupada por pesquisadores(as) da área de origem do periódico. A coordenação dos processos editoriais como um todo tem um suporte na Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) pela possibilidade de oferecer regularmente cursos rápidos que suprem algumas eventuais deficiências.


Entretanto, quantas mulheres cientistas você conheceu em sua trajetória de estudo, antes de ingressar no Ensino Superior? Até quando, enquanto praticantes da cidadania, fomentamos indiretamente a formação de “Einsteins femininos” para incentivar garotas a se interessarem por ciência? Até pouco tempo atrás, estereótipos masculinos tendiam a mensurar a intelectualidade feminina. Essas ações e comportamentos, infelizmente, contribuíram e contribuem para a perpetuação da discriminação de gênero. A norte-americana teórica especialista em história do gênero na ciência, Londa Schiebinger (2001), reforça a importância de haver uma representação igualitária em todas as ciências para que mulheres possam ter as mesmas liberdades que os homens sempre tiveram no curso da humanidade. No entanto, o movimento de “trazer mulheres” para a ciência reivindica mudanças estruturais na cultura até hoje vigente, pode ser compreendido que: “[...] a ciência moderna é um produto de centenas de anos de exclusão das mulheres [...]”. (SCHIEBINGER, 2001, p. 37).


A pesquisa intitulada Editoras-chefes de revistas em Ciência da Informação no Brasil: representação e representatividade (NEVES, 2022), teve como objetivo geral analisar como editorias dos periódicos científicos nacionais em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) estão organizadas, levando em consideração o protagonismo de mulheres e as disparidades de gênero na política de editoração. Especificamente, foi mapeado periódicos científicos nacionais em BCI; apresentou-se as editorias por gênero; identificou-se o protagonismo de mulheres e as disparidades gênero na política de editoração; e discutiu-se sobre e como o protagonismo pode ser representado socialmente pela mulher que ocupa a função de editora-científica dos periódicos da BCI brasileira. Parte da pesquisa está descrita no artigo: A questão de gênero na editoria de revistas científicasrepresentatividade das mulheres (NEVES; NOVO, 2022), publicado no v. 36, n. 2, da revista Biblos.


Após o mapeamento dos periódicos científicos em BCI no Brasil, e apresentar as editorias por gênero, que era um dos objetivos do estudo e ao debruçar-se sobre como estão estruturados os comitês editoriais de cada uma dessas revistas científicas levando em conta o gênero, observou-se as seguintes informações: ao todo foram 1139 membros das equipes editoriais analisadas, das quais 62 pessoas constituíam as editorias científicas independente do sexo. Entretanto, as mulheres foram a maioria entre os membros com 58,56%, porém, quando se trata de editorias, 48,39% foram constituídas por mulheres, e os homens ficaram com 51,61% (NEVES, 2022).


Pode-se frisar também que o campo que abrange os estudos de gênero é um exercício ainda complexo hoje em dia, isso porque pode envolver diversas e diferentes áreas do conhecimento da mesma forma assim como indivíduos. Pode abarcar diversos campos de pesquisa, e por esse arranjo, o gênero é mutável, e em cada grupo (étnicos, religiosos, raciais, de classe), é possível ter uma denotação. Sendo assim, a não representatividade, de maneira geral, da mulher nas diversas áreas científicas implica não apenas na atenuação do desenvolvimento intelectual e econômico de toda uma nação, mas compromete também de forma rigorosa o futuro de qualquer país. Com as pesquisas sobre mulheres ganhando mais notoriedade e variedade de abordagens na atualidade, pôde-se enfim ter condições de reavaliar o trabalho científico existente. Dessa forma, a presença da mulher, finalmente, pôde fazer a diferença reconhecida, mas ainda é preciso mais esforços para poder fazer a “voz” ser ouvida em mais espaços, ocupando e representando mais papéis.


Mas, quanto a caracterização do indivíduo mulher, as expressões de feminização contribuíram em diferentes ambientes de trabalho para construir estereótipos para marcar diferenças entre homens e mulheres dentro das carreiras e comunidades científicas no decorrer da história recente. Indiretamente, tais estratégias contribuíram para criar mecanismos de segregação, as conhecidas barreiras estruturais que repercutem em suas participações em atividades laborais. Confirmando o que já afirmava a pesquisadora Olinto (2012), a presença de mulheres nas academias, o acesso e a incorporação nas diversas áreas do conhecimento, mesmo que facilitados com o decorrer do tempo, fato que deixou evidente a identificação das diferenças que carregam as preferências profissionais. E com a BCI não poderia ser diferente.


O ser mulher também significa ocupar os mais variados espaços para dar visibilidade, seja na ciência, seja na divulgação científica. A produção intelectual da mulher precisa ser reconhecida e valorizada em todas as áreas do conhecimento. À medida que as mulheres, assim como os homens que ocupam as editorias, tornam-se responsáveis por monitorar e garantir a imparcialidade, os prazos, a eficiência e a civilidade, aspectos estes que fazem parte do processo editorial dos periódicos científicos.


A mulher na ciência foi o norte do estudo de Neves (2022), por esta razão, priorizou-se pesquisar seu protagonismo na editoração científica. Nesse sentido, a análise de gênero foi fundamental para traçar perfis e demonstrar a ressignificação de papéis. Uma vez que homens e mulheres assumem papéis da sociedade, na maioria das vezes, por regras convencionadas como determinantes. Isso faz considerar que a estrutura patriarcal infiltrada desde o surgimento do capitalismo na sociedade pode ser vista com uma das principais responsáveis pela pouca valorização de mulheres, que seguiram pela vida acadêmica e profissional dentro da sua trajetória social.


Referências


FREITAS, Marília Augusta; LEITE, Fernando Cesar de Lima. Atores do sistema de Comunicação Científica: apontamentos para discussão de suas funções. Informação & Informação, Londrina, v. 24, n. 1, p. 273 – 299, jan./abr. 2019. DOI:


LEITE, Fernando César Lima; COSTA, Sely Maria de Souza. Gestão do conhecimento científico: proposta de um modelo conceitual com base em processos de comunicação científica. Ciência da Informação, Brasília, DF, v. 36, n. 1, jan./abr. 2007. DOI: https://doi.org/10.1590/S0100-19652007000100007. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-19652007000100007&script=sci_arttext. Acesso em: 02 ago. 2020.


NEVES, Tatiely Mayara de Oliveira. Editoras-chefes de Revistas em Ciência da Informação no Brasil: representação e representatividade. Orientadora: Hildenise Ferreira Novo. 2022. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2022.


NEVES, Tatiely Mayara de Oliveira, NOVO, Hildenise Ferreira. A questão de gênero na editoria de revistas científicas: representatividade das mulheres. Biblos, Rio Grande, v. 36, n. 2, 2022. DOI:https://doi.org/10.14295/biblos.v36i2.14699.


OLINTO, Gilda. A inclusão das mulheres nas carreiras de ciência e tecnologia no Brasil. Inclusão Social, Brasília, v. 5, p. 68-77, 2012. Disponível em: http://revista.ibict.br/inclusao/article/view/1667. Acesso em: 01 fev. 2021.


SANTOS, Boaventura de Souza. Da sociologia da ciência a política científica. Revista Crítica de Ciências Sociais, Coimbra, v. 1, p. 11-56, jun. 1978. Disponível em: https://estudogeral.sib.uc.pt/handle/10316/10790. Acesso em: 28 jul. 2020.


SCHIEBINGER, Londa. O feminismo mudou a ciência? Bauru: EDUSC, 2001.



Dados biográficos das autoras


Mestre em Ciência da Informação Universidade Federal da Bahia. Graduada em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal da Bahia e em Letras Vernáculas pela Universidade do Estado da Bahia.

Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8471-8156




Doutora em Difusão do Conhecimento pela Universidade Federal da Bahia. Mestre em Ciência da Informação, Convênio UFF/IBICT. Especialização em Didática para o Ensino Superior. Graduação em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal Fluminense.

E-mail: denisenovo@gmail.com Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0986-7164



 

Como citar:


NEVES, Tatiely Mayara de Oliveira; NOVO, Hildenise Ferreira. Editoria feminina: representação e representatividade na comunicação científica dentro da Biblioteconomia e da Ciência da Informação. Ciência da Informação Express, Lavras, v. 3, 23 dez. 2022.

 

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